Debate sobre PJL nº 482/XI/2ª e Projeto de Resolução nº350/XI/2ª
Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados
Este é um debate sobre transparência e responsabilidade. O Bloco de Esquerda que em 2008 não esteve à altura do desafio da responsabilidade perante os contribuintes, os depositantes e até os trabalhadores do BPN, vem agora propor a alteração de regras indemnizatórias e assumir um estatuto de paladino do acesso à informação sobre o processo BPN.
O Partido Socialista em matéria de relação com o setor financeiro, designadamente com o BPN não tem nada a esconder e não aceita lições nem de transparência nem de responsabilidade quer da direita quer do Bloco de Esquerda.
O PS não patrocina nem é cúmplice na amnésia branqueadora da crise financeira internacional de 2008, nem das circunstâncias especificamente nacionais que determinaram a opção pela nacionalização do BPN .
Igualmente surpreende esta iniciativa do Bloco de Esquerda ao parecer associar-se aqueles que querem neste momento, com destaque para o candidato presidencial da direita, lançar uma cortina de fumo desviando atenções da responsabilidade criminal, indemnizatória, de legalidade financeira e cívica dos gestores do BPN, que têm rosto e história pessoal e política, para os que em nome do interesse público, por determinação legal e no exercício de mandato de gestores públicos, têm desempenhado funções no BPN desde a sua nacionalização.
Está a prestar um mau serviço à transparência democrática, ao esforço de recuperação da economia portuguesa e à criação de condições para a confiança dos agentes económicos e dos portugueses o Bloco de Esquerda com a mirabolante iniciativa legislativa apresentada. Mas espanta ainda mais, pela cegueira sectária de vistas curtas, a espantosa convergência táctica com as preocupações do candidato Cavaco Silva.
O PS é um partido que não tem dúvidas sobre as causas económicas e os fundamentos ideológicos da crise global de 2008 nem sobre os seus efeitos em Portugal. Mas na resposta à crise pautamos a nossa atuação pelo primado dos princípios da legalidade democrática, da transparência e da responsabilidade nos seus planos político, financeiro e criminal.
O BPN é um caso de irresponsabilidade financeira, é um símbolo de um modelo económico baseado no desvario do crédito fácil e em aplicações financeiras de risco, é o símbolo de uma geração de gestores nascidos do caldo político das maiorias absolutas de Cavaco Silva.
É no plano daquilo que cabe aos tribunais um caso de polícia com responsabilidades pessoais que cabe à Justiça determinar com toda a independência, celeridade e respeito pelas garantias de defesa. Para o PS o BPN sempre foi um caso, por um lado de Justiça por outro de garantia de credibilidade do sistema financeiro. Por isso sabemos quem são os rostos do BPN mas nunca pretendeu o PS transformá-lo num caso de política.
Em 2008 o modelo de desenvolvimento assente na especulação financeira e imobiliária , multiplicando o crédito irresponsável e operações de engenharia financeira criativa conduziram à maior crise global das economias desenvolvidas ,primeiro de confiança no sistema financeiro , depois a recessão simultânea em 2009 das economias americana, europeia e japonesa , a salvação dos mercados irresponsáveis e a limitação dos danos colaterais para as famílias e as empresas pela intervenção dos Estados com a consequente explosão dos défices públicos até à atual crise da zona euro.
O BPN foi à dimensão portuguesa parte deste percurso especulativo com práticas ilegais associadas. As dificuldades do banco já tinham sido identificadas mas a falência do Lehman Brothers, em Setembro de 2008 e de duas das maiores sociedades de crédito imobiliário americanas tornaram inevitável o choque com a realidade. È nesta narrativa da crise global , e do seu impacto em Portugal que se insere a nacionalização do BPN.
A crise de credibilidade do sistema financeiro não foi antecipado por esses oráculos televisivos genericamente endeusados como “os economistas”, nem por esses mitificados mercados perante os quais é tão reverente o candidato Cavaco Silva, designadamente pelas agências de rating que sempre deram nota máxima às instituições financeiras que abriram falência e aos produtos financeiros agora apelidados de ativos tóxicos .
Esta é a crise que demonstrou uma falha ideológica no modelo de capitalismo liberal. Por isso na Europa as pequenas economias mais desreguladas a Islândia e a Irlanda, curiosamente ambos países do Norte com pouco Sol, foram as primeiras vitimas qual pequenos Lehman Brothers ou grandes BPNs.
Porque a memória de alguns economistas e políticos é fraca convém não lançar bruma sobre a crise de 2008 e as suas causas para que não seja permitido um inaceitável back to business as usual Também aqui a direita se não quiser ler Stiglitz ou Paul Krugman pode ter à cabeceira a confissão de incrédulo fracasso de Alan Greenspan-
Foi este o contexto da opção pela nacionalização do BPN em 2008 perante prejuízos de cerca de 600 milhões de euros e imparidades superiores a mais de 2 mil milhões de euros.
As alternativas poderiam ter sido a falência do BPN com o efeito de arrastamento que teria sido inevitável no quadro da economia internacional em Novembro de 2008 ou a socialização dos prejuízos como fizeram o Reino Unido ou a Irlanda . Essa solução teria sido economicamente desastrosa e socialmente injusta. A abrupta queda do PIB irlandês nos últimos anos e o défice de 32% não custou até hoje um cêntimo aos contribuintes para desespero da demagogia do Bloco de Esquerda. Quer a falência quer o pagamento por todos da irresponsabilidade dos gestores do BPN teriam tido efeitos devastadores sobre a economia portuguesa.
A opção foi atribuir ao maior e mais fiável banco português a Caixa Geral de Depósitos, exemplo de ativo estratégico que deve e vai continuar no setor público,a gestão do BPN visando a determinação da qualidade dos seus ativos, a introdução de adequadas regras de gestão financeira e a destrinça entre vários domínios e natureza da sua atividade.
Talvez o Bloco de Esquerda, que sabemos ser insensível à necessidade de uma resposta à crise que salvaguarde a estabilidade económica, o funcionamento do sistema financeiro e a solidariedade com a defesa do modelo social europeu , devesse reconhecer que só a nacionalização permitiu salvaguardar os mais de 2mil postos de trabalho do BPN.
È hoje do domínio público que o BPN cresceu desmesurada e bruscamente enquanto história de fraude e de más práticas financeiras, mas importa lembrar que tem uma rede disseminada por mais de 200 balcões, que tem cerca de 300mil depositantes e uma implantação significativa junto de pequenas e médias empresas fora dos grandes centros urbanos.
Teremos oportunidade na próxima semana de ouvir e questionar gestores profissionais reconhecidos como são o dr. Faria de Oliveira e o dr. Francisco Bandeira sobre a situação atual do BPN e os problemas graves com que se defronta. Contudo os indicadores conhecidos da opinião pública são , na mais difícil conjuntura de sempre para toda a banca portuguesa, moderadamente encorajadores. Os resultados negativos baixaram para resultados muito inferiores aos de 2008, o numero de clientes aumentou mesmo que com compreensível baixa do valor médio dos depósitos e foi possível separar a rede de retalho de um conjunto de realidades a colocar em três sociedades veículo -participações sociais, património imobiliário e créditos por cobrar. Aponta-se para este conjunto de ativos um valor nominal de cerca de 4mil milhões de euros, a realizar gradualmente segundo a evolução das condições de mercado e a resolução das questões jurídicas ainda pendentes.
É neste quadro que devem ser discutidas as propostas do Bloco de Esquerda.
Diria em síntese que a proposta de resolução é desnecessária mas inconsequente. Que o projeto de lei é em parte inútil e em parte irresponsável sendo todo ele de uma demagogia inconsistente.
Pretende o Bloco acrescentar duas normas salvadoras à Lei nº62-A/2008,de 11 de Novembro .,na parte em que regula o regime geral da apropriação pública por via de nacionalização.
A primeira alteração destrói séculos de construção do conceito de responsabilidade limitada que está na base da personalidade júridica das sociedades comerciais confundindo a responsabilidade dos accionistas pelos prejuízos com os eventuais direitos a indemnização. O Bloco diz que os responsáveis pelas irregularidades do BPN não devem ser indemnizados, no que teria razão, mas cria uma regra geral absurda de indemnização ao Estado pelo património liquido negativo.
Falemos claro que é o que o Bloco não gosta por não servir o seu facilitismo demagógico. O que está subjacente a esta proposta é a negação ideológica do conceito de empresa e de iniciativa privada enquanto base de uma economia de mercado. O PS defende a livre iniciativa no quadro de mercados regulados e responsabilizamos a desregulação selvagem pela crise que vivemos e pelo alargamento das desigualdades na distribuição do rendimento.
O PS fala claro sobre as regras sobre a nacionalização do BPN . Os acionistas só serão indemnizados pela nacionalização caso a avaliação a efetuar por pelo menos duas entidades independentes viesse a apurar uma situação patrimonial liquida na altura da nacionalização e está suspenso qualquer direito a indemnização enquanto correrem processos por irregularidades praticadas na gestão do banco .
Nem sempre foi assim, designadamente nas regras sobre calculo do valor das indemnizações do artº1º do Decreto-Lei nº332/91, de 6 de Setembro ,o qual admitia a indemnização com base na alegada rendibilidade da empresa. Essa lei por ironia histórica é assinada por Cavaco Silva e Oliveira e Costa, foi esse critério que se pretendeu afastar aquando da nacionalização do BPN.
A segunda proposta do Bloco é inútil e rasteiramente demagógica ao pretender afastar a indemnização em caso de condenação por prática lesiva dos interesses do Banco .É isso que já hoje resulta da lei penal e das regras de responsabilização dos gestores financeiros .É isso que desejamos seja feito pelos tribunais, pelo Banco de Portugal e relativamente e entidades cotadas pela CMVM.
Inútil, irresponsável e demagógico o projeto de lei do Bloco nada ajuda à credibilidade do sistema financeiro , à qualidade da regulação ou ao funcionamento da Justiça pelo que contará com a nossa oposição.
O PS é o partido da defesa do Estado de direito e da transparência democrática por isso viabilizamos a realização de audições na próxima semana com o Ministro das Finanças, o Governador do Banco de Portugal e os presidentes da Caixa e do BPN, nas quais desejamos tudo seja perguntado e esclarecido nos limites do respeito palas garantias da legalidade democrática ,contribuindo para a criação de um ambiente de confiança no sistema financeiro e na economia portuguesa. Gostaríamos de saber os custos para o BPN resultantes das declarações irresponsáveis denunciadoras de falta de sentido de Estado do candidato Cavaco Silva. Temos duvida sobre os fundamentos e a viabilidade legal de alguns dos pressupostos da resolução apresentada pelo Bloco de Esquerda mas não inviabilizaremos , face a necessidade de tudo clarificar, quaisquer pedidos de esclarecimentos adicionais.
O PS não acusa os mercados de vender gato por lebre nem põe lança insinuações sobre a idoneidade e profissionalismo da gestão pública .No caso do BPN como sempre queremos os mercados regulados, os infratores investigados e punidos e a criação da confiança nesessária para o funcionamento do sistema financeiro, a correcção do défice , a criação de emprego e o crescimento económico.
6.01.2011 Eduardo Cabrita GPPS
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